domingo, 14 de novembro de 2010

DISTINÇÃO ENTRE A CAPACIDADE JURÍDICA DO DIREITO CIVIL ATUAL E O DIREITO ROMANO


Esta pequena pesquisa consiste em fazer um paralelo ou uma distinção entre a capacidade jurídica do direito civil atual e o direito romano, abordando:a)   aquisição da personalidade jurídica; b)   aquisição da capacidade jurídica, especificando os que são absolutamente e os relativamente incapazes; e c)    os critérios usados pelos legisladores quanto ao item anterior.


 
INTRODUÇÃO

        
Permanecem como fator de relevante importância no nosso Direito civil a herança da história e as relações dos povos romanos, há mais de vinte e cinco séculos. Bem claro, há de se considerar que os novos tempos têm-se aventurado em modificar costumes daquela época, porém muitas condutas influenciam ou se moldam, durante séculos, segundo eventos contemporâneos.
Não são poucos os institutos que, comparadamente, ainda persistia no Código Civil de 1916, quase todos emanados das convicções e de sistemas normativos do povo romano. Já o no novo Código Civil vislumbra posições bem mais nacionais, com correntes modernas, capaz de explicar as profundas alterações havidas no plano dos fatos e de nossas ideias, tanto em razão do progresso tecnológico como em virtude da nova dimensão adquirida pelos valores da solidariedade social, entre outras exigências de atualização dos preceitos legais que o povo ou até mesmo a natureza impõem.

A) AQUISIÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA ( ART. 2º, CC)

1. No Direito Romano
A pessoa natural, também chamada pessoa física, é o homem, e sua existência se inicia com o nascimento. O nascituro não é ainda pessoa, mas protegida desde a concepção (vagidos ou qualquer movimento do corpo) e durante a gestação, que reconhecidamente o direito romano protegeu: considerava o nascituro como já nascido (ficção) para fins de reservar-lhe vantagens, em direção da herança: nasciturus pro iam nato habetur, quotiens de commodis ipsius partus agatus.
O feto teria que nascer com vida e com forma perfeita. Os nascidos defeituosos e anormais não recebiam proteção. Os direitos da pessoa física extinguiam-se com a morte, alguém teria que provar se a presunção de morte fosse pelo desaparecimento. Não conhecida também o registro civil, no entanto, o funeral e o preparo para o túmulo eram muito solenes, entre os ius gentium.
2.No Direito Civil Brasileiro
 PESSOA FÍSICA NATURAL è          É todo “ser humano”, sujeito de direitos e obrigações.   Para ser considerado PESSOA NATURAL basta que o homem exista.  Todo homem é dotado de personalidade, isto é, tem CAPACIDADE para figurar numa relação jurídica, tem aptidão para adquirir direitos e contrair obrigações.

 Capacidade:       é a medida da personalidade.  Pode ser de DIREITO ou de FATO

  • Capacidade de Direito: é próprio de todo ser humano, que a adquire assim que nasce (começa a respirar) e só a perde quando morre; Em face do ordenamento jurídico brasileiro a personalidade se adquire com o nascimento com vida, ressalvados os direitos do nascituro desde a concepção.

·        Capacidade de Fato: nem todos a possuem; é a aptidão para exercer, pessoalmente, os atos da vida civil (capacidade de ação).  Só se adquire a Capacidade de Fato com a plenitude da consciência e da vontade.
      ·        A pessoa tem a CAPACIDADE DE DIREITO, mas pode não ter a CAPACIDADE DE FATO.

  • Ex.:  os recém nascidos e os loucos têm somente a capacidade de direito, pois esta capacidade é adquirida assim que a pessoa nasce.  Eles podem , por exemplo exercer o direito de herdar.  Mas não têm capacidade de fato, ou seja, não podem exercer o direito de propor qualquer ação em defesa da herança recebida, precisam ser representados  pelos pais ou curadores.

  • Se a mãe puder exercer o pátrio poder, comprovando a sua gravidez, pode ser investida judicialmente na posse dos direitos sucessórios que caibam ao nascituro.

·        Capacidade Plena à  é quando a pessoa tem as duas espécies de capacidade (de direito e de fato). 

·        Capacidade Limitada à Quando a pessoa possui somente a capacidade de direito;  ela é denominada INCAPAZ, e necessita de outra pessoa que a substitua, auxilie e complete a sua vontade.


Começo da Personalidade à      A personalidade começa com o nascimento com vida, o que se constata com a respiração (docimásia hidrostática de Galeno).  Antes do nascimento não há personalidade, mas a lei, todavia, lhe resguarda direitos para que os adquira se vier a nascer com vida.


Extinção da Personalidade à  A personalidade se extingue com a morte real, física.


a)    Morte Real           A sua prova se faz pelo atestado de óbito ou pela justificação, em caso de catástrofe e não encontro do corpo. A existência da pessoa natural termina com a morte, e suas conseqüências são:  extinção do pátrio poder;  dissolução do casamento;  extinção dos contratos pessoais;  extinção das obrigações etc.

b)    Morte Simultânea (comoriência) – é quando duas ou mais pessoas (quando houver entre elas relação de sucessão  hereditária) morrem simultaneamente, não tendo como saber quem morreu primeiro.

c)  Morte Civil  Quando um filho atenta contra a vida de seu pai ele pode ser   excluído da herança por indignidade,  como se “morto fosse”, somente para o fim de afastá-lo da herança.    Outra forma de Morte Civil é a ofensa à honra (injúria, calunia e difamação), ou a pessoa evitar o cumprimento de um testamento.

d)  Morte Presumida – ocorre quando a pessoa for declarada ausente, desaparecida do seu domicilio, ou que deixa de dar noticias  por longo período de tempo.  Os efeitos da Morte Presumida são apenas patrimoniais.  O ausente não é declarado morto, nem sua mulher é considerada viúva.  Os herdeiros poderão requerer a sucessão definitiva 05 (cinco) anos após a constatação do desaparecimento.


B) AQUISIÇÃO DA CAPACIDADE JURÍDICA (ART. 3º,CC)
1.No Direito Romano
A capacidade jurídica, também chamada de capacidade de direito, significa a aptidão do homem para ser sujeitos de direitos e obrigações. Modernamente todo homem tem a capacidade de direito desde o nascimento. Não era assim no direito romano, pois distinguiam diversas categorias de homens.
Para que existisse a completa capacidade jurídica de gozo (direitos e obrigações) seria necessário, no direito romano que fosse: LIVRE – CIDADÃO ROMANO – INDEPENDENTE DO PÁTRIO PODER (sui iuris, paterfamilias). Eram pressupostos da capacidade jurídica de gozo em Roma, que, por estes critérios, examinava-se a liberdade no STATUS LIBERTATIS, a cidadania no STATUS CIVILITATIS  e a situação da família no STATUS FAMILIAE.
Para o critério liberdade (Status libertatis), os homens podiam ser livres ou escravos, segundo as regras do direito romano. Os livres eram aqueles não escravos. Os escravos não podiam ser sujeitos de direitos, eram apenas objetos de relação jurídica, nem, tampouco, relações familiares no campo do direito. Por ser escravo (também o filho de escrava) não podia ter direito de privado nem publico. Não tinha patrimônio e se o adquirisse pertencia ao seu dono, embora o direito reconhecesse a personalidade humana do escravo na forma de pessoa servil (persona servilis).
Já sob o critério da cidadania (Status civilitatis), o direito romano garantia apenas aos cidadãos romanos. Os estrangeiros (peregrini) não tinham capacidade jurídica de gozo no concernente aos direitos e obrigações do ius civile, embora aplicasse as regras do ius gentium, forma que o estrangeiro podia adquirir pelo direito dele, mesmo em Roma.
Por fim, o critério de situação familiar (status familiae) representava a organização  da família romana, a qual distinguia entre as pessoas sui iuris (paterfamilias), independentes do pátrio poder e pessoas alieni iuris, sujeitas ao poder de um paterfamilias.


2.No Direito Civil Brasileiro
Assim como definimos a capacidade supra, os direitos e as obrigações são preceitos de aquisição para legitimar em grau e plenitude os sujeitos de direito, entendendo-se, portanto:  
Legitimação à         é a aptidão para a prática de determinados atos jurídicos.  Consiste em saber se uma pessoa tem, no caso concreto, CAPACIDADE para exercer PESSOALMENTE seus direitos.  Tolhem a legitimação: saúde física e mental, a idade e o estado.   A falta de legitimação não retira a capacidade e pode ser suprida.

Representação:       para absolutamente incapazes;    
Assistência:             para relativamente incapazes



Graus de Capacidade à compreendem os:

  • Capazes 

  • Absolutamente Incapazes – devem ser representados; não podem participar do ato jurídico à o ato é NULO; Os atos praticados pelos absolutamente incapazes são considerados nulos de pleno direito quando não tiverem sido realizados por seu representante legal. 

  • Relativamente Incapazes – devem ser assistidos; o ato jurídico pode ser anulável. Os atos praticados pelos relativamente incapazes são considerados anuláveis quando praticados sem a devida assistência.
          Os relativamente incapazes podem ser mandatários.


·         Emancipados:   Adquire-se pelos pais e/ou vias judiciais.


·Que têm capacidade plena civil pela maioridade.

C) OS CRITÉRIOS USADOS PELOS LEGISLADORES QUANTO AO ITEM ANTERIOR (ESPECIFICANDO OS QUE SÃO ABSOLUTAMENTE E OS RELATIVAMENTE INCAPAZES) – ART. 4º, CC.

1.No Direito Romano
A independência do pátrio poder não tinha relação com a idade. Um recém nascido, não tendo ascendente masculino, era independente do pátrio poder, ao passo que um cidadão de 70 anos, com o pai ainda vivo, era alieni iuris, isto é, na qualidade de filiusfamilias, ao poder do pai.
Os alieni iuris não eram absolutamente incapazes. Tinha plena capacidade no campo dos diretos públicos. Isso quer dizer que eram relativamente capazes. Tenham direitos privados também. Entre os direitos, podiam destacar:
diretos públicos                                                    direitos privados
votar                                                                          casar-se
ser votado                                                                  pátrio poder sobre os netos
servir nas legiões                                                       patrimônio para o paterfamilias
Eram sujeitos de capacidade relativa aqueles que necessitassem de tutela e curatela, cujos institutos tinham por fim cuidar de interesses de uma pessoa que sozinha não podia tomar conta dos seus negócios, isto é, relacionavam com a problemática da capacidade para a prática jurídica.
Os incapazes eram tutelados para o que o tutor cuidasse e protegesse a herança das famílias, pelo critério de idade e sexo.
A curatela visava a acautelar interesses patrimoniais, nos casos de incapacidade, como loucura, a prodigidade, outros impúberes e as mulheres.
Assim, capacidade plena, completa (absoluta) dava-se, no ius civile, aos sujeitos pelas condições de ser livre, ser um cidadão romano e independência do pátrio poder.

2. No Direito Civil Brasileiro
Legitimação à         é a aptidão para a prática de determinados atos jurídicos.  Consiste em saber se uma pessoa tem, no caso concreto, CAPACIDADE para exercer PESSOALMENTE seus direitos.  Tolhem a legitimação:  saúde física e mental, a idade e o estado.   A falta de legitimação não retira a capacidade e pode ser suprida.

Representação:       para absolutamente incapazes;    
Assistência:             para relativamente incapazes


Graus de Capacidade à é a proporção e qualidade do sujeito

·        Capazes  -   maiores de 18 anos (excetuando-se as pessoas  possuidoras de uma ou mais características abaixo elencadas);


·        Absolutamente Incapazes – devem ser representados; não podem participar do ato jurídico à o ato é NULO; Os atos praticados pelos absolutamente incapazes são considerados nulos de pleno direito quando não tiverem sido realizados por seu representante legal.  São absolutamente incapazes:

·        menores de 16 anos;
·        loucos/alienados de todo gênero (submetidos à perícia médica);
·        surdos e mudos que não conseguirem exprimir sua vontade;
·        ausentes (declarados judicialmente – morte presumida).

·        Relativamente Incapazes – devem ser assistidos; o ato jurídico pode ser anulável. Os atos praticados pelos relativamente incapazes são considerados anuláveis quando praticados sem a devida assistência.  São relativamente incapazes:

·        maiores de 16 anos e menores de 18 anos;
·        pródigos (que têm compulsão em gastar e comprar); o pródigo para casar precisa de autorização do seu curador.
·        silvícolas (índios).

Observações:
·        Quanto à incapacidade relativa, pode-se afirmar que o menor - entre 16 e 18 anos - equipara-se ao maior quanto às obrigações resultantes de atos ilícitos, em que for declarado culpado..

·        A incapacidade do menor cessará com o seu casamento. (homem:  só com autorização dos pais ou responsável ,e só a partir dos 16 anos;  mulheres: a partir dos 16 anos)

·        Se uma pessoa relativamente incapaz vender um imóvel, o adquirente sabendo que ele só tinha 16 anos de idade, sem a devida assistência dos seus representantes legais, este ato será anulável.

·        Os relativamente incapazes podem ser  mandatários.


  Emancipação:                          É a aquisição da plenitude da capacidade antes dos 18 anos, habilitando-o para todos os atos da vida civil.  A emancipação, por concessão dos pais ou por sentença judicial, só produzirá efeito após sua inscrição no Registro Civil.

·        Adquire-se a emancipação e conseqüente capacidade civil plena:

·        por ato dos pais ou de quem estiver no exercício do pátrio poder, se o menor tiver entre 16 e 18 anos. Neste caso não precisa homologação do juiz, bastando uma escritura pública ou particular, e registrada em cartório;
·        por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver 16 anos;
·        pelo casamento;
·        pelo exercício de emprego público efetivo, na Administração Direta;
·        pela formatura em grau superior;
·        pelo estabelecimento civil ou comercial com economia própria.

à  A capacidade plena civil (maioridade civil) se dá aos 18 anos e a maioridade penal.
O novo Código Civil dedica-se um título inteiro sobre a tutela e curatela, (do artigo 1.728 ao art. 1.783E) cujas descrições tratam de interesses do menor, que, representado ou assistido por tutor ou curador, solucionam atos jurídicos.

CONCLUSÃO
Como se observa além do critério idade usado para medir a capacidade plena do sujeito de direito, no direito romano e no direito civil brasileiro, outras formas legitimam ou locupletam (sexo, loucura, prodigidade) as relações jurídicas, ditas como direito subjetivo, para poder exigir o comportamento de outrem (lado ativo), ou para obrigar ao referido comportamento nessa relação (lado passivo).
REFERÊNCIAS

1.FARIAS, Cristiano. Doutrinas do Direito Civil, vol. 1 – Parte Geral – e os livros de Direito Romano, nos capítulos de direito da família, tutela, curatela e das pessoas.
2.VENOSA, Silvio de  Salvo. Direito Civil. Parte Geral. 6ª ed. São Paulo. Atlas, 2007.
3.PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2006.

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